Brasília-DF. Rodoviária: problemas evidenciam necessidade de outros meios de transporte

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Foto: Agência Brasília
Construída no ponto de encontro entre os dois eixos que desenham Brasília — o Rodoviário e o Monumental —, a Rodoviária do Plano Piloto é o coração da cidade, onde a vida pulsa desde a inauguração do terminal, em 1960. De lá para cá, no entanto, o espaço sofreu com a ação do tempo e, agora, apresenta problemas decorrentes da falta de acompanhamento periódico.

O sinal de alerta mais recente aconteceu no mês passado, quando um relatório da Companhia Urbanizadora da Nova Capital (Novacap) apontou que fissuras em vigas colocavam a plataforma superior sob risco de desabamento. Os problemas estruturais, decorrentes da falta de manutenção, resultaram na interdição de parte do terminal e de pistas que passam pela plataforma superior. A previsão é de que as obras, que começaram na quarta-feira, durem três meses.
O principal terminal rodoviário de uma cidade construída para 500 mil habitantes recebe, hoje, cerca de 700 mil pessoas diariamente. No projeto original de Brasília, Lucio Costa planejou um espaço com bares e restaurantes, além de uma plataforma inferior de embarque separada por vidro dos boxes dos quais saem os ônibus. A plataforma superior, que também se tornou ponto de partida e chegada de coletivos, foi planejada para carros, com amplos estacionamentos, e para pedestres, com praças nas extremidades.

A ideia do terminal no centro dos eixos era permitir uma visão vasta da Esplanada dos Ministérios. No Relatório do Plano Piloto, no qual detalhou como seria o arranjo de Brasília, o arquiteto explicou a disposição em mão única do tráfego: “(O sistema) obriga os ônibus na saída a uma volta, num ou noutro sentido, fora da área coberta pela plataforma, o que permite ao viajante uma última vista do eixo monumental da cidade antes de entrar no eixo rodoviário residencial — despedida psicologicamente desejável”, descreveu.

Arquiteta e professora da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de Brasília (FAU/UnB), Cláudia da Conceição Garcia comenta que Lucio Costa pensou no terminal como um ponto de encontro, tal como uma casa de chá. “Com o tempo, ela (Rodoviária) assumiu características um pouco diferentes. Mas é algo que não se esperava. Ali, há uma movimentação grande de pessoas diariamente”, analisa Cláudia.

A especialista menciona a visita do arquiteto à capital federal nos anos 1980 e lembra trecho de depoimento dele, no qual relatou ter encontrado um terminal ocupado pelos “verdadeiros brasilienses”. Ela ainda avalia que o crescimento físico do espaço chegou a um limite e que ele não tem mais condições de concentrar e disseminar toda a demanda por coletivos do DF e Entorno. “A plataforma inferior não tinha como suprir uma intervenção, então colocaram algumas linhas na parte superior. Mas ficou algo desconfortável. As pessoas ficam sob sol e chuva. O que devemos pensar é em uma Rodoviária associada a outros pontos estratégicos de transporte público”, sugere.

Repensar

Coordenador do Centro Interdisciplinar de Estudos em Transportes da UnB (Ceftru), Pastor Willy González concorda com a necessidade de rearranjar fluxos e repensar essa concentração. Como saída, ele recomenda o reforço a terminais nas asas Sul e Norte e até na antiga Rodoferroviária. “Trabalhando linhas de transporte descentralizadas e com o metrô atendendo a parte norte da cidade, haveria fôlego (para assistência à população)”, comenta González.

Ele acrescenta que o fato de a Rodoviária ser considerada o “coração da cidade” implica dificuldades para mudanças mais rápidas, o que pode levar a situações que antecedam um colapso. “A Rodoviária está chegando a 60 anos. Há questões físicas que a infraestrutura dela não comporta mais. Alguns sintomas (de colapso) já aparecem, como a necessidade urgente de manutenção, o espaço de circulação que fica reduzido durante greves, os conflitos que surgem quando há falta de serviço de transporte público”, elenca o professor.

Fabiana Batista, 29 anos, e a irmã, Fernanda Marques, 34, reconhecem esse cenário. As moradoras do Paranoá enfrentam filas, coletivos superlotados e dificuldades no acesso. “Vi uma moça que precisou pedir ajuda a um policial para conseguir subir com o carrinho do filho, porque as escadas rolantes e os elevadores estavam parados, como sempre. Os banheiros vivem fechados e sujos e os ônibus, nos horários de pico, são uma lástima. É muita bagunça e desorganização para a capital do país”, critica Fabiana.

Problemas antigos


No início da década de 1970, as páginas do Correio revelavam uma dualidade característica da Rodoviária do Plano Piloto: um terminal marcado pela “beleza e funcionalidade”, mas que oferecia ao “observador mais sensível um espetáculo que deprime e minimiza a sua importância”. “Há, ali, crianças abandonadas, magras e sujas, mendigos, larápios, prostitutas e paqueradores a assediarem a todos que nela necessariamente transitam”, diz reportagem de 26 de novembro de 1972.

Nas décadas seguintes, os problemas aumentaram. A degradação do terminal tornou-se alvo de reclamações. Houve reformas, mas o que nasceu para se tornar a alma de Brasília passou a denunciar a desigualdade social que coloca o Distrito Federal em segundo lugar entre as unidades federativas com as rendas mais desiguais do país, perdendo apenas para o Amazonas.

A falta de policiamento também entrou para a lista. Uma ao lado da outra, as rodoviárias do Plano Piloto e a do Entorno — que recebe coletivos da região metropolitana do DF desde que o BRT foi inaugurado, em 2014 — tornaram-se palcos de crimes. Assassinatos, tráfico de drogas, furtos e consumo de entorpecentes. Quem passa por elas, especialmente à noite, convive com a sensação de insegurança.

Moradora do Mangueiral, Clara D’Ávilla, 18, lida com isso sempre que espera o ônibus de volta para casa, depois das 22h, na plataforma inferior. “De vez em quando, vejo policiais, mas é mais quando o pessoal da Agefis (Agência de Fiscalização do Distrito Federal, hoje DF Legal) está aqui”, observa. A jovem também relembra três situações de assédio que sofreu. “Um homem me falou para ir para a casa dele. Outro, ficou me chamando de linda. Um terceiro passou por mim na escada e começou a gritar, me xingando de vadia. Algumas pessoas viram e até riram. Ninguém fez nada”, relata Clara.

Insegurança


Administrador da Rodoviária, Josué Martins de Oliveira afirma que o local conta com um posto policial e que 12 PMs se revezam em rondas preventivas pelo terminal, cuja área total é de, aproximadamente, 187 mil metros quadrados (o equivalente a 26 campos de futebol). “Eles (policiais) não estão em todos os locais. A questão de segurança pública tem de melhorar muito. Mas, todos os dias, entre as 19h e as 20h, trago a polícia motorizada para cá. E o trabalho no posto ocorre 24 horas por dia. A população tem um sentimento de insegurança, mas nós não estamos parados”, assegura Josué.

“Realmente, não me sinto segura”, comenta a servidora pública aposentada Luciana Borges, 66. “Há policiais, mas não é sempre. Até presenciei um furto, quando um homem passou correndo e levou o celular de uma mulher. Ela não conseguiu recuperar o aparelho”, relata. Luciana frequenta o terminal duas vezes por semana, mas conta que, se pudesse, evitaria. “Muita gente perambula por aqui. O local ficou pequeno para a quantidade de pessoas. E as reclamações de amigos e familiares são as mesmas. Se eu não dependesse do transporte coletivo, não viria aqui”, desabafa a moradora de Taguatinga.

A Polícia Militar informou à reportagem que não divulga dados relativos ao efetivo ou à escala da corporação por questões de segurança e estratégia.

Manutenção


É comum encontrar pessoas em situação de rua no terminal rodoviário, que se torna abrigo, principalmente, à noite. O administrador Josué Martins reconhece a situação como um desafio para a saúde pública, uma vez que há muitos dependentes químicos entre eles. “Fizemos várias campanhas com as secretarias de Saúde e de Desenvolvimento Social. Para nós, é bastante complicado, pois não é só chegar, pegar e levar. É preciso um trabalho de políticas públicas”, analisa.

Em relação aos ambulantes, cuja presença também é alvo de polêmicas, Josué diz que a Administração da Rodoviária conseguiu tirar 80% deles com auxílio do DF Legal — antiga Agefis. Quando o Correio visitou o terminal, foi possível encontrar alguns vendedores nas plataformas. Mas o novo ponto de concentração deles, desde que começaram as obras na parte superior, é o estacionamento em frente ao Conjunto Nacional.

Fonte: Correio Braziliense 

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